Por Carla Luisa Marin
Há um ano que parece um século, fechávamos a edição número 60 do Letras. E neste mesmo espaço, comentei sobre 2019 ter sido um ano surpreendente (mal sabíamos o que viria por aí). Também comentei sobre a natureza da cíclica das coisas, e nesse ponto “acertei” um pouco mais: falei do movimento constante de tudo, seja por causa ou apesar das forças atuantes.
Se o já inesquecível 2020 – esse sim, um ano supreendente – foi marcado por adiamento, distanciamento e apreensão, também deverá ser lembrado pela criatividade e pela capacidade de adaptação e reinvenção. Que melhor oportunidade para buscar novos caminhos de ser e de fazer do que um contexto distópico digno de filme?
É claro que a cultura não iria passar incólume por tudo isso. Aliás, algumas das formas de manifestação artística foram justamente as mais afetadas por uma realidade em que aglomeração é risco. Se podemos ler, ouvir e assistir na segurança de nossos lares, fomos também privados do show, da exposição, da sala de cinema, do teatro. Fomos privados do transitar, do conviver, do ver de perto e de espaço públicos, tão de direito e tão naturais ao ser e fazer das artes e da cultura. Tão enriquecedores delas.
Não à toa, o “sentimento de distopia” – e o pensar sobre o que fazer diante dele (e com ele) – estão presentes em vários artigos deste número do Letras. O movimento continua, mesmo que dentro de um tal “novo normal”, ainda um certo desconhecido em suas limitações e possibilidades. Sim, porque caso não se acreditasse que há caminhos possíveis, já teríamos parado tem muito tempo, com ou sem pandemia. O movimento continua, porque sempre há lugar para desenhar novos formatos de utopias com aquilo que temos nas mãos. Novas formas de ser e de fazer. É estranho, ou mesmo assustador? Talvez. Mas é inevitável e inspirador também – e o movimento continua.
Por isso mesmo trazemos para você, caro leitor, uma edição daquelas, histórica por vários motivos. Não apenas porque ela sai no surpreendente 2020, ou porque vem recheadíssima como nunca de conteúdos incríveis, com antigos e novos colaboradores igualmente incríveis. Também porque ela reflete a intensidade e a importância de pensar nossos temas de interesse nesse momento singular, de revisitar nossas ideias de utopia e nossos papéis nisso tudo.
Ser. Fazer. Adaptar. Reinventar. Criar, mais, e muito, e sempre.
E que venha 2021!
Boa leitura!
A Mira Feroz De Adriane Garcia Ana Elisa Ribeiro
Aurea Mediocritas: a receita para uma vida feliz Por Heloísa Maria Penna / Editoria Alexia Teles Duchowny
Jonhy Golem, De Samuel Rawet: Sobre Criadores E Criaturas Lyslei Nascimento
O Palácio de Cristal, 1851 Bruno Campos
Nova Velha Escola – de Design – na Praça da Liberdade Cláudio Santos Rodrigues e Sérgio Antônio Silva
Quem tem medo da criança pensante? Maria Thereza da Silva Pinel
Pandemia, cultura e suas emergências José Marcio Barros
Admiráveis vidas dissidentes Por Luiz Morando / Editoria Felipe Cordeiro
Londres: a história de uma cidade duradoura Thiago Jardim
Não é só colorir o cinza CURA: resistência por meio da arte Laura Barbi
O ano que devorou o mundo Por Tullio Dias / Editoria Cinema de Buteco
O lirismo austero de Louise Glück Ana Caetano
Museu Da Inocência, Um Museu Obra Isabela Vecci
Admirável (e controverso) Teatro Digital Por Raquel Castro / Editoria Julia Guimarães
Eu sumo daqui para existir em outro lugar Daniela Paoliello
Tempo novo, patrimônio infinito Por Liana Portilho e Mila Corrêa da Costa / Editoria Liana Portilho
A Adaptação De Orquestras Sinfônicas À Pandemia Marcelo Ramos