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Gozemos

Editoria Márcia Charnizon
Francilins está para além da fotografia. Mineiro de Belo Horizonte, atualmente vive exilado na Bretanha Francesa. Atua em diversos países, especialmente Brasil, Colômbia e França. Cresceu na religião, estudou Sociais/Antropologia e fez mestrado em Artes Visuais. É autor do livro Limbo e trabalha ativamente como artista, educador, curador, editor. Tem especial atração por Sexo, Morte e Religião. Atravessa a corda bamba e mergulha fundo em seus projetos marginais e viscerais. Dedica-se a pesquisa em fotografia, meio que realiza grande sorte de experimentos.
Começou como curador realizando a mostra Arqueologia do Encontro, de Claudia Andujar. Recebeu diversos prêmios, entre eles, Prêmio Nacional Marc Ferrez de fotografia – FUNARTE e Conrado Wessel de Fotografia
Em 2015 guiou o projeto Cemitério do Peixe: Arte, Morte, Magia. Empreitada que engloba um mês de residência artística e uma semana de comunhão entre artistas e pensadores. Retiro artístico nesta lugarejo “das Almas” incrustado no Espinhaço dos Gerais. Instalou na cidade uma câmera escura de rocha.
Ainda em 2015 lançou a monografia do artista radical JaymeFygura, de quem foi “personal curator” durante os anos que precederam a publicação.
Em 2016 instaurou o Museu do Sexo Hilda Furacão, o primeiro do gênero no Brasil. Concebeu e coordenou o projeto que contou com residência artística, intervenções públicas, diversas exposições e itinerância internacional.
É um artista que coloca na mesa, com genialidade, a questão das fronteiras.
Gozemos!
Por Francilins
Chèrie Márcia,
A partir da provocação para pensarmos o tema FRONTEIRA(S), eclodiram aforismos que relacionam algumas reflexões sobre o tema às minhas proposições sócio-artísticas.
O PRINCÍPIO: INDIVIDUAÇÃO PANTEÍSTICA
De maneira elementar, fronteira é o limite do ser, funda a diferença eu-outro, dentro=fora. Lugar de separação das coisas, mas também de contatos, encontros: transbordamentos.
MICROPOLÍTICA DAS MOSCAS
Como fronteira é matéria na moda, pode parecer novidade, mas é uma novela fractal que começa com a gênese do Universo. História que passa pela criação do átomo (o indivisível), consolidação das moléculas e galáxias, assim como pela evolução das células e organismos.
Do ponto de vista político, a fronteira segrega desde que os filhos de Eva cercaram a Árvore do Conhecimento, passando pela construção da Muralha da China e a parede das nossas residências. Na contemporaneidade a ampliação das barreiras entre México e Estados Unidos, assim como as migrações em massa no Velho Mundo, atualizam as disputas dos nossos antepassados.
Transnacional.
NÃO FOMOS CATEQUIZADOS
Somos sopa de devires em suruba carnavalesca. Para ilustrar esta percepção do psiquismo humano, cito o diálogo de Hans Staden com o líder tupinambá, que atualizo como epígrafe na obra Jaguaretê:
(…) Cunhambebe tinha uma grande cesta cheia de carne humana diante de si e estava a comer uma perna, que ele fez chegar perto de minha boca, perguntando se eu também queria comer. Respondi que somente um animal irracional devora a outro, como podia então um homem devorar a outro homem? Cravou então os dentes na carne e disse: Jauára ichê (sou jaguar).
Transhumano.
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Liquidifica certezas, mistura lama, limites e pensamentos numa mesma canja fecunda. Caldo seminal, como aquele jorra dos amantes e funda a humanidade. O encontro sexual é importante experiência de atravessamento e mescla de fronteiras. Não é preciso ser nenhum Freud para perceber a centralidade do assunto, desde pré-história é questão vibrante nas paredes dos sítios arqueológicos, assim como é temática abundante nas mesas dos bares.
Para o antropólogo Levi-Strauss o Homem não nasce do sexo, mas do seu controle. Afinal, todas as sociedades sapiens têm o “tabu do incesto” como componente estrutural. Nos rincões do Brasil, o ostracismo cultural mineiro gestou uma adaptação peculiar às interdições sexuais: a Guaicurus. O maior complexo de prostituição da Latinoamérica, uma pérola bizarra entranhada no coração das Minas.
Dito: quanto mais aperta a massa, mais escorre entre os dedos.
Em 2016 instaurou-se nesta zona o Museu do Sexo Hilda Furacão, o primeiro do gênero no Brasil. Fagulha que acionou o tornado, inflamou os ânimos, propôs discussões. De certa forma, provoca revisões culturais e relacionais neste complexo “demasiadamente humano”, a partir de uma perspectiva artística.
O que decantará desta ebulição? A resposta ao futuro cabe. Certos de que além da calmaria, o que vem depois da tempestade é outro cataclismo. Na dúvida: Gozemos!
POIS(S)ON
O viajante que chega ao fim da linha encontra o Cemitério do Peixe, um vilarejo fantástico incrustado no interior dos Gerais. Uma cidade às avessas onde a maior parte das pessoas está debaixo da terra. Das mais de trezentas casas visíveis, apenas três são ocupadas por encarnados. Aroldo abre seu bar todos dos dias. Durante uma semana no mês de agosto o cenário muda radicalmente, mais de 5000 peregrinos aportam no lugarejo para celebrarem São Miguel, com as almas ali enterradas.
Após mais de uma década documentando a comunidade, uma revelação. Deparei-me com a imagem da minhanamorada, falecida precocemente devido a um câncer fulminante, amalgamada às fotografias do Cemitério do Peixe: Materializações Luminosas.
Porto incontornável a todos humanos, a morte é tabu primeiro da vida e reflexão última da arte. Em 2015 propusemos a comunhão entre artistas, intelectuais, mestres do saber popular naquela cidade dedicada Almas. Vivências que fluíram emolduradas pela Serra do Espinhaço, proporcionando religações pés-pedras, arte-almas, espírito-água, periferia-contemporaneidade e muitas outras indescritíveis viagens.  Transcendência.
(R)EVOLUÇÃO
Transformação é lei universal. Explosões nucleares precedem novas moléculas, gametas eclodem um novo ser, um passo e não estamos mais no mesmo lugar.
Arte como catalisador simbólico das mutações sociais, das concepções estéticas, do psiquismo humano. Esta é a crença de autores que abalam estruturas com sua potência criadora, provocando reviravoltas na vida ordinária.
Louvemos Claudia Andujar! Fotógrafa judia, sobrevivente da segunda Guerra mundial, que coordenou a criação Reserva Yanomami. Área de proteção bio-cultural que tem o dobro do tamanho da Suiça, seu país natal. Salve JaymeFygura! Fortaleza soteropolitana que enfrenta a “sociedade podre” em cada minuto da sua existência. Roguemos por Joel Peter-Witken, que a partir do fogo fátuo da morte cria novas formas para vida. Sigamos Dona Maria do Batuque, que firma com mestria os passos do Boi de São Romão. Façamos coro a Ai Weiwei, que mostra o dedo do meio para o mais antigo Império da Terra e com a outra mão acena para o mundo. Exaltemos os artistas do cotidiano: mendig@s, polític@s, put@s, religios@s, pais e filhas nos ensinam a conceber o mundo para além do maniqueísmo belo-terror, correto-inválido, deus-anticristo.
Somos energia (r)evolutiva. Façamos com arte!
Palavra-chave para fechadura “FRONTEIRA”: TRANS (radical)
Transa, transferência, transporte, transfusão, transbordamento, transposição, trânsito, transmigração, transcultural, transmissão, translation, transnacional, transplante, transgênico, transgênero, transexual, transhumano, translúcido, transversal, transubstanciação, transpiração, transgressão, transformação, transcendental.

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